28.10.12

Mito #2: As pessoas são “frias”

Desde a infância ouvi dizer que certos povos, como os alemães por exemplo, são “frios”. Mais tarde, comecei a entender que a nossa cultura brasileira, devido a uma série de fatores, é que é “sentimental”. A diferença entre tais tendências opostas, sentimentalismo de um lado, e uma postura mais direta do outro, provavelmente teceu pré-conceitos não só dos brasileiros em relação a alguns povos estrangeiros como, muito provavelmente, o oposto também. Hoje, depois de bastante leitura e observação, acredito que há um mito tanto em nos enxergarmos como “calorosos” quanto em vermos certos povos como “frios”.

Historicamente, o Brasil foi formado em grande parte por estrangeiros movidos pela “ética do aventureiro”. Muitos dos portugueses, por exemplo, viam na colônia nada mais do que um atalho para uma riqueza fácil e rápida, que pudesse depois ser ostentada na terra natal. Some-se a isso o fato de que o trabalho duro, por séculos, foi relegado primeiro aos índios e depois aos africanos trazidos como escravos, e se pode chegar ao entendimento de que retidão moral não foi o ponto alto na formação da cultura brasileira.

Apesar da simplificação, pode-se afirmar que a nossa formação histórica levou, em grande medida, à gestação do que hoje chamamos de “jeitinho brasileiro”. E faz parte desse tal “jeitinho” ser sentimental. Assim como faz parte do nosso trato social ocultar certas verdades para não ofender o interlocutor.

Muito desse sentimentalismo, entretanto, não tem profundidade. Trata-se apenas de convenções sociais. Quantas vezes não encontramos alguém e dizemos “vamos marcar algo!”,  ou “passa lá em casa qualquer hora!”, com o quê ambos interlocutores concordam, mas que ambos sabem que não será posto em prática?

Já em outros países, com diferentes desenvolvimentos históricos, tais mecanismos sociais não existem, ou existem em menor grau. E a Noruega está incluída nessa categoria. Ainda que, no geral, as pessoas tendem a ser mais diretas, ou honestas, no trato social, não se pode dizer que sejam mais “frias”. Simplesmente não é visto como ofensivo o expressar-se de forma mais direta, mesmo que se diga algo em forte contraste com o que o interlocutor afirma.

A verdade, portanto, é que tanto o “calor humano” no Brasil não é tão sincero como pode parecer a um estrangeiro desavisado, quanto a aparente “frieza” de alguns povos, como os noruegueses, não pode ser confundida com a ausência de sentimentos, por parte de um brasileiro pouco informado.

26.9.12

Mito do mundo desenvolvido #1: da perfeição

Quantas vezes você, no Brasil, ouviu expressões do tipo “é por isso que somos terceiro mundo” ou “por isso que o Brasil não vai pra frente”. Esses são sintomas latentes do que penso ser um preconceito bem incrustado no nosso inconsciente coletivo: “somos inferiores aos países de primeiro mundo”.

E o outro lado desse fenômeno é crer que países desenvolvidos, sobretudo na América do Norte e Europa, são melhores do que o Brasil em tudo.

O ponto central desse erro de raciocínio é a extrapolação que fazemos, às vezes até sem querer, da comparação de pontos específicos para o caso geral.

Desde que comecei a viajar para o primeiro mundo pela primeira vez, há 3 anos, pude começar a pontuar onde as diferenças realmente estavam. E, agora, tendo vivido um ano no país que há tempos ocupa o topo do ranking de melhor IDH do mundo, creio que consigo diferenciar ainda melhor os atributos que fazem um país desenvolvido melhor e, principalmente, os problemas que mesmo uma sociedade “avançada” enfrenta.

Pois, sim, há problemas mesmo no rico e igualitário Reino da Noruega. E, não, dinheiro e igualdade de oportunidades não resolvem tudo.

O primeiro susto ao ler os jornais noruegueses quando cheguei (com ajuda do Google Translator, claro), foi notar que há um alto grau de incidência de estupros em Oslo, e mesmo em diversas outras cidades norueguesas. Pelo site da polícia de Oslo é possível comprovar que foram 213 casos de estupro reportados na cidade em 2011, mais 43 tentativas.

Esse número é absurdo para uma cidade de padrão tão elevado como essa, e considerando que a população é de apenas 600 mil habitantes.

Mas a alta incidência de violência sexual tem ligação direta, segundo declarações da própria polícia, com o alto consumo de bebidas alcoólicas por jovens. Muitos jovens bebem bem além do ponto de auto-controle, incluindo aí as moças, que se tornam então presas fáceis para estupradores.

Aliás, muitos dos estupradores são de origem não-norueguesa, e não-ocidental, e aí se chega ao desafio seguinte: o da imigração. Claro que a imigração traz benefícios para o país, mas uma mudança significativa na base populacional em curto espaço de tempo (últimos 25 anos) trouxe turbulências para uma sociedade antes tão homogênea.

Esses pontos já são suficientes para mostrar que nem tudo é perfeito por aqui. Há outros ainda. Mas paro por enquanto. E até breve.

11.8.12

9 meses de Noruega

Há pouco mais de 9 meses atrás, mudei-me com minha esposa para a Noruega. Foi a mudança mais signficativa das nossas vidas.

A razão da mudança foi uma proposta de trabalho, em primeiro lugar, e, depois, a grande vontade de morar fora e vivenciar uma cultura e língua diferentes.

Desde então, tive assunto para muitos posts, mas contive a decisão de escrever até agora.

Eu sabia que poderia estar perdendo o frescor das novidades, que foram diversas, mas também quis evitar, propositadamente, as primeiras impressões erradas.

Passado o tempo de uma gestação, sinto-me mais preparado para comentar sobre a mudança, possivelmente com menos exageros e maior precisão, especialmente porque pude conversar com diversos noruegueses, sempre ouvindo opiniões diferentes sobre esse país e sua cultura. Pude, também, viver o dia-a-dia de um trabalhador, ainda que num contexto específico, mas imerso no cotidiano de Oslo, a capital norueguesa.

Por fim, tendo chegado no Outono, passei pelo Inverno, Primavera e, agora, Verão. E como as estações aqui são bem diferenciadas, tê-las vivenciado todas é necessário antes de se formar uma opinião consistente sobre a vida nessas latitudes nórdicas.

Fica a introdução. Voltarei em breve tratando dos mitos que se tem ao pensar na Noruega, ou em outros países desenvolvidos, e o quanto de verdade há neles. Até lá.